quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Velhas festas de fim de ano

Volto à minha antiga casa que não mais existe. Mas existe em mim! Portanto, não preciso de chave. Basta girar a maçaneta e entrar.
Gostaria de precisar um fim de ano específico, mas todos os anos entre 1950 e meados dos anos 60 foram sempre iguais e felizes...
Alternadamente, entre os meses de outubro e novembro, meus pais, meus avós iam à Cidade para comprar os presentes de Natal. Saíam às escondidas e – mistério – voltavam para casa carregando pacotes  e iam diretamente para os seus quartos.
No final de novembro iam à Rua 25 de março comprar uma nova guirlanda para a porta, algumas bolas, enfeites e festões para a árvore de Natal. A tradição rezava que era preciso acrescentar a cada ano um novo enfeite à árvore. Compravam também um enorme pacote de algodão para “fazer neve”.
No início de dezembro, vovô, papai e tio Amedeo iam a Itaquera comprar o “Pino” (pinheiro) que, em casa era colocado em uma grande lata de óleo “Sol Levante”.
Seis de dezembro começava o Natal! Alegria e ansiedade...
O pinheiro era colocado em um canto da sala de jantar. A lata de óleo era coberta por uma camada de papel-crepom verde e, sobre ela, uma camada de celulóide amarelo e laços de fita vermelha.
Um a um os enfeites e adereços eram dispostos na árvore. Cabia ao vovô colocar a ponteira, enquanto meu pai fixava a guirlanda à porta de entrada.
A segunda etapa da noite foi forrar o tampo da “credenza” (aparador) menor com feltro e sobre ele colocar um espelho, onde foram dispostas as figuras do nosso pequeno presépio.
Tudo pronto para o Natal! E eu começava a esperar pelo dia 25, que parecia estar a mil anos-luz longe de mim...
Vinte e quatro de dezembro. Eu andava pela casa prestes a ter um ataque de ansiedade. Veio a noite e nonno e nonna, após o jantar, arrumam-se para ir à Missa do Galo.
Não comemorávamos a véspera. Lá pelas dez da noite, mamãe, esperta como uma raposa dava-me duas fatias de rabanada e uma caneca de  gemada “carregada” com conhaque e me levava para a cama. Meia-noite meus pais colocavam os presentes sob a árvore e iam dormir.
Manhã do dia 25: -“A sveglià’ miei maialini! È già Natale!” (Acordem meus leitõezinhos! Já é Natal!) – gritava o meu avô, batendo uma contra a outra, duas tampas de panela. Segundos depois eu e meu irmão em pijamas, o molecão tio Amedeu, em camiseta e cueca, atacávamos os presentes sob a árvore.
Em casa o almoço de Natal era da família e também dos filhos que Nossa Senhora nos mandava. E quase todas as famílias os recebiam.
Os “filhos de Nossa Senhora” eram os imigrantes solteiros (Italianos, espanhóis, gregos, portugueses) que, sem ninguém, sem família estavam aqui em busca de melhores dias. Moravam nos quartos de pensão ou nos cortiços e acabavam “adotados” pelas famílias da vizinhança. Era enternecedor ver todas aquelas “mammette” (mãezinhas), com lágrimas nos olhos, recebendo os filhos de Nossa Senhora. De dor da separação elas entendiam. E muito!
Após o almoço, a confraternização. Era um “vattene viene” (vai e vem) de vizinhos, amigos, parentes e aparentados. Música, festa e vinho. Na rua, a molecada exibia os presentes que ganharam...
O Ano Novo tinha a véspera com sua ceia e seus fogos. Tinha a Corrida de São Silvestre e o barulho ensurdecedor das buzinas dos carros e dos apitos e sirenes das fábricas. A ceia era farta. Tanto que sobrava muito para o almoço de Ano Novo. E era tradição da nossa família engolir três grãos de “melagranno” (romã) para que sempre estivéssemos juntos. Os espanhóis comiam uma colher de “lentejas” (lentilhas).
O almoço do primeiro do ano era igual ao do Natal.
Feliz Ano Novo! Agora, era só esperar pelo Dia de Reis...
Eu e todas as crianças, na véspera de Reis, colocávamos os nossos sapatos à porta, fora de nossos quartos, à espera de presentes (balas, confeitos, chocolate, etc.) Ninguém colocava mais os sapatos à janela, pois havia o receio de que fossem roubados. Os espanhóis colocavam capim dentro dos sapatos, para alimentar os camelos dos Reis Magos. Em agradecimento os reis deixavam presentes.
Dia seis! Após o almoço, a sobremesa era o Bolo de Reis que, além de delicioso, trazia brindes em seu interior. Depois do “Magnificat” (Hora da Ave Maria – Seis da tarde.) começávamos a desmanchar a árvore de Natal e o presépio. E também, começar a sonhar com o próximo fim de ano...
É hora de partir. Saio silenciosamente dessa minha casa que não mais existe, mas que ainda existe em mim e fecho a porta calmamente. Olho para o chão e em frente a ela ainda está o velho capacho que sempre dizia a todos “Bem-Vindo”. Capacho verdadeiro. Não como os muitos capachos que mascaravam a hipocrisia daqueles que Mal-Recebiam os seus parentes e amigos.
Fecho o portão e caminho de volta à realidade sentido o perfume da Dama da noite que florescia no jardim... Floresce ainda em mim...

texto enviado por:  Wilson Natale








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6 comentários:

  1. que bella storia

    Maria

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  2. Natale..... depois de ler o seu texto não resisti e fechei os meus olhos e abri bem devagarinho a porta lá de casa: ao redor da árvore os pacotes de presentes,as guloseimas feitas com capricho sobre a mesa e na sala de estar os meus pais e todos os meus irmãos: familia feliz!

    mais uma vez muito obrigada pelo texto

    abraço grande

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  3. Também curti muito o dia seguinte na rua, toda meninada com os presentes ganham na véspera, era um tal de emprestar a boneca, a bola, o outro emprestava a bicicleta e assim por diante, tempo bom.

    Neusa Maria

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  4. Mainha,q cronica maravilhosa...Meus cumprimentos ao autor...Um artista das letras...bjos

    Pedro L.Trevisan

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  5. Parabéns que cronica mais linda, me emocionei
    Feliz Natal

    Maria José

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  6. Meu caro essa história balançou meu coração

    Anita Dias

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