O bonde fechado era chamado de camarão, talvez pela cor vermelha que apresentava.
No sentido contrário tomei o bonde inúmeras vezes para ir ao
Largo Treze em Santo Amaro. Eu estudei o ginásio e colegial em um colégio na
estrada de Itapecerica (IAE – Instituto Adventista de Ensino) e ia até o Largo
Treze para tomar um ônibus até o Capão redondo, diariamente. E fazia o caminho
de volta. Eu sabia de cor o nome de todas as paradas do bonde de Moema até
Santo Amaro. A primeira parada era a de Indianópolis, que era chamada de balão
do bonde. Alguns bondes que vinham do centro iam apenas até essa parada e
faziam ali o retorno. Em 1968, comecei a ir de ônibus escolar, então parei de
ir de bonde, mas no último dia de circulação do bonde (27 de março de 1968),
fiz questão de descer em Santo Amaro e ir de bonde até minha casa.
O bonde era muito presente na vida do bairro e dos
estudantes. Lembro-me de deixar moedas no trilho do bonde para que o bonde ao
passar, amassasse a moeda. Tenho uma moeda guardada ainda, amassada dessa
forma. Outra coisa que eu gostava de aprontar e muitos outros meninos também
era pegar uma das pedras existentes ao lado dos trilhos e colocar em cima do trilho.
O bonde quando passava espatifava a pedra e soltava muita faísca. Diziam que
era perigoso e que poderia até descarrilar o bonde. Espatifei muitas pedras,
mas nunca consegui descarrilar nenhum bonde...
Uma brincadeira muito comum na Alameda Iraé era empinar
papagaios. Eu fazia muito bem o “peixinho”, só duas varetinhas cruzadas e usava
a linha 24 para empinar, cheguei a soltar um com seis carreteis inteiros,
praticamente não dava para ver o papagaio, apenas sentia pela tração na linha.
Outro papagaio muito comum na época era o “maranhão”, era feito com três
varetas, mas esse eu não sabia fazer bem, mas tinha vontade de ter um.
Morava ao lado da linha do bonde entre as avenidas Chibarás
e Açocê, um rapaz de chamado de “Carioca”. Uma vez juntei todo o meu dinheiro e
comprei um Maranhão por cinquenta cruzeiros. E fui feliz soltar o papagaio. O
Álvaro, filho da Dona do Bazar Ana Maria, fez uma proposta de brincadeira, de
fazer um papagaio pegar o outro. Aceitei, mas um enroscou noutro e os dois
caíram em algum lugar que eu nunca descobri. Perdi o tão sonhado papagaio no
primeiro dia. Fiquei sem...
Outra coisa que começava a aparecer (pelo menos para mim), o
cerol, era uma linha com cacos de vidro, finamente moídos. Dava trabalho fazer,
colocavam-se cacos de vidro dentro de uma lata de óleo, e se martelava durante
um bom tempo, até conseguir um pó de vidro suficientemente fino para colar na
linha. Como a criatividade era grande, alguém descobriu que essa lata ao ser
colocada sobre o trilho do bonde seria amassada por ele e...num instante, como
um passe de mágica ... pozinho fininho de vidro ...
Quantas latas aqueles bondes amassaram.
Ruy Ernesto N. Schwantes