segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Meu Pai não era fácil

Meu pai não gostava de mim, e eu muito menos dele.
Da parte dele foi uma bronca pelo fato de minha mãe morrer do meu parto. Por causa disso apenhei até aos 17 anos. Para apanhar não precisava fazer nada de mais, apanhava por pouca coisa. Até então eu não entendia, mas La por perto dos 11 anos percebi o motivo. Numa de suas broncas ele disse: Em vês dela, devia morrer você filho da puta! Minha mãe de criação (ele casou depois de 6 meses) por diversas vezes tentou me defender, mas sofria o perigo de apanhar também. Depois que fiquei sabendo que ela era minha mãe de criação, ficou ressabiada por não ser minha mãe biológica, mas aos poucos percebeu que eu era um relapso, e não levava a coisas mais a frente. Para mim ela era minha mãe e pronto. Isso ela ficou sabendo mais tarde quando uma mulher perguntou: Como vai sua madrasta? A resposta foi forte. Madrasta é a puta que pariu! Coitada da mulher pelo jeito nunca mais na vida chamou alguém de madrasta.
Via os meus amigos se dar bem com seus pais e, eu tinha a maior inveja por não ter a mesma chance. Esse ranço vinha da parte dele, e eu deixava o barco correr. Apanhava por nada, qualquer coisinha era motivo para boas bordoadas em qualquer parte do corpo. Tapa na nuca foi muitos que eu batia a boca na mesa e abalava os dentes da frente que ficavam moles uns dois ou três dias e depois voltava ao normal.
Adorava ouvir o jogo pelo radio, nas ultimas rodadas do ano de 1950, o Palmeiras ficou com um ponto de vantagem com direito a ser campeão pelo empate. Justo naquele domingo minha mãe cismou de ir ao cinema e eu não pude ouvir justo o melhor jogo, o ultimo do campeonato. Na verdade nem sei que filme estava passando, meu pensamento estava no Pacaembu. Ficava pensando: Quem será que ta ganhando? Fui ao banheiro e la tinha um são-paulino satisfeito dizendo que estava um a zero gol de Teixeirinha, e o juiz tinha anulado outro.
Quando sai do cinema ainda com aquele 1 x 0 para o São Paulo, na cabeça, mas quando chegamos a Rua do Porto, dona Laura estava na Rua me esperando, sabendo que eu era fanático pelo Palmeiras veio me abraçar dizendo que o meu time era campeão.
Quando cheguei a casa meu pai que tinha visto a cena falou: Ta contente? E uma bofetada de mão em concha no meio da minha cara fez sair sangue do nariz, ai fui ao tanque tentar estancar o vermelhinho, Aproveitava para ouvir o Narciso Vernizzi, no programa Palhinha filmando a Rodada que mostra a gravação da transmissão do Pedro Luiz, o sangue já estava no fim e eu fingi que tinha mais, só para ouvir o Narciso. Até que foi uma boa  bordoaba aquela, pois assim pude ficar a par do que tinha acontecido no Pacaembu.
Meus piores dias eram os sábados e domingos, quando meu pai estava em casa. Ai, eu não podia ir a Rua jogar bola e ainda tinha que estudar. Tanto a noite e nos fins de semana. Às vezes ia até as 22 horas. Um dia ele foi dormir e esse idiota continuou lendo para as moscas ouvir. Minha mãe levantou e disse: O que esta fazendo ai menino, vai dormir!
Pra ver que tipo de pai que eu tinha, que para ele estudar era ler o livro da escola. Ler em voz alta. Fala verdade, meu pai não era um Burro?  Quando chegava o meio do ano, eu já sabia o livro de cor e salteado. Dai para frente eu fazia um jogo de futebol. Palmeiras x Corinthians.
As primeiras letras maiúsculas com a letra C, era gol do Corinthians e P, gol do Palmeiras. Eram os anos 1950 e até  no livro o Corinthians ganhava.
Só parei de ler o livro a noite quando mudamos para o Brooklin e não tinha energia elétrica, foi durante abril de 1951 até maio de 1953, ai eu já tinha saído da escola.
 Quando mudamos para o Brooklin tinha um córrego bem à frente de casa. Meu pai chamou eu, e meu irmão e disse: Não quero nenhum de vocês brincando no córrego. Foi a mesma coisa a que dizer pra mim. Vai lá Brinque a vontade.
No dia 26 de Abril daquele mesmo ano de 1951, 25 dias depois de morar la fui à venda pra minha mãe, mas como tinha uns guarus à beira da água lá foi eu pegar. O barranco desabou e lá fui eu barranco a baixo. Desloquei o ombro e quebrei o braço. Eu que já apanhava por nada, imagine o que não aconteceu ai: La mesmo no leito do hospital São Luiz, levei uns sopapos, mesmo ainda não tendo sido atendido. Com o braço esquerdo uns 10 centímetros maior do que o outro.
Pelo fato de ter deslocado o ombro não podia gessar. Tinha que ficar com um aparelho, com o braço e frente e o braço virado a esquerda, formando um, L. Fiquei com aquele aparelho mais de dois meses. Me, lembro que alem do serviço de colocar o ombro no lugar e imobilizar o braço. O Hospital São Luiz cobrou 120 cruzeiros do aluguel do aparelho. Do quarto ouvi e vi o banzé que meu pai formou alem de gritar, falou todo tipo de palavrão. Deu certo a, explosão dele. Só sei que se eles não deixaram de graça diminuíram bem o preço. Fiquei todo aquele tempo sem ir à escola. Quando voltei em Julho o diretor da escola disse que eu tinha que voltar para o segundo anos por causa dos meses que fiquei sem ir a escola. Meu pai com certeza teve outra atuação daquelas. Pelo jeito deve ter falado um monte de palavrão e ate ameaçado meter a mão na cara de todos.  Só sei que continuei no terceiro ano e ainda passei para o quarto e ultimo anos.
O tempo passava e, eu  continuei a apanhar, e eu não tinha reação alguma, nem chorava, já estava acostumado. Meu apelido na Rua era “Armazém de pancadas”. Dona Laura  aquela que me abraçou dizendo que o Palmeiras tinha sido campeão, não perdia tempo. Um belo dia conversando com dona Elvira, no portão (coisa corriqueira)  num domingo e, aproveitando a propaganda do Toddy.”  Já tomou seu Toddy hoje?”  Perguntou: “Mário, Já apanhou hoje? “.
 Quando cheguei aos 17 anos apanhei pela ultima vez. Por motivo algum, levei um, tapa na cara, ai foi muita humilhação. Pela primeira vez mostrei uma forte reação, levantei uma cadeira e, ia dar na cabeça dele. Sua reação foi de espanto. Ele que estava com um litro de leite na mão para mandar na minha cabeça disse: Ah quer dizer que já é homem? Daí pra frente ele ficou esperto. Nunca mais se atreveu a querer me bater. Em 1962 ele morreu, confesso que não senti muito a sua morte. Que coisa estranha não?


texto enviado por: Mario Lopomo

6 comentários:

  1. Lopomo
    Impossível imaginar nem de leve, nem por um segundo tudo o que você passou ,pois tanto o meu pai(que você conheceu)como minha mãe eram totalmente contra qualquer tipo de agressão e, assim também criei os meus filhos: sem encostar as mãos.
    Infelizmente existem pais e pais, assim como filhos e filhos.
    Lopomo seu texto é corajoso e emocionante.

    um grande abraço

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  2. Você não podia sentir a morte de seu pai: que pai, heim? ninguém merece
    ah se fosse hoje heim? êle ia estar mal arranjado na vida

    Adelaide F. Gomes

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  3. tentando localizar uma loja na avenida Pavão acabei encontrando este blog , que alegria, li um pouco das histórias e com calma quero ver e ler tudo.
    Meu Deus que história esta daqui, acredito que pais iguais a esses existem aos montes.
    Joice

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  4. Parabéns, Mário, pela coragem e pelo testemunho.
    Valeu!
    Muita paz!

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  5. marta ovando obara8/22/2011 7:52 PM

    Mario o que é isso?Que violência gratuita , que maldade com uma criança indefesa.Ainda bem que o tempo passou e você pôde dar um sustinho nele e ser respeitado, finalmente.Espero que você tire esse pesadelo e viva em paz...Abraços Marta.

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  6. Mario Lopomo
    essa estupidez do seu pai não era só dele tenha certeza, pois muitos pais ,naquela época,espancavam os seus filhos, eu mesmo lembro de um dia que espancava meus primos,ainda bem que muita coisa mudou,mas muitos pais hoje em dia batem em seus filhos.
    corajosa história

    Danilo

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