domingo, 28 de setembro de 2014

O bonde

                                                                       

O bonde fechado era chamado de camarão, talvez pela cor vermelha que apresentava.
A linha do bonde passava por Moema vindo do centro da cidade, passava pela Vila Mariana e se dirigia para Santo Amaro. Usei essa linha inúmeras vezes, indo para os dois destinos. No centro o destino era a Praça João Mendes. Na realidade o ponto ficava na esquina das ruas Dr Rodrigo Silva e Rua Álvares Machado, enquanto esperava o bonde para voltar para casa costumava comer um pastel delicioso em uma pastelaria que havia por ali.
No sentido contrário tomei o bonde inúmeras vezes para ir ao Largo Treze em Santo Amaro. Eu estudei o ginásio e colegial em um colégio na estrada de Itapecerica (IAE – Instituto Adventista de Ensino) e ia até o Largo Treze para tomar um ônibus até o Capão redondo, diariamente. E fazia o caminho de volta. Eu sabia de cor o nome de todas as paradas do bonde de Moema até Santo Amaro. A primeira parada era a de Indianópolis, que era chamada de balão do bonde. Alguns bondes que vinham do centro iam apenas até essa parada e faziam ali o retorno. Em 1968, comecei a ir de ônibus escolar, então parei de ir de bonde, mas no último dia de circulação do bonde (27 de março de 1968), fiz questão de descer em Santo Amaro e ir de bonde até minha casa.
O bonde era muito presente na vida do bairro e dos estudantes. Lembro-me de deixar moedas no trilho do bonde para que o bonde ao passar, amassasse a moeda. Tenho uma moeda guardada ainda, amassada dessa forma. Outra coisa que eu gostava de aprontar e muitos outros meninos também era pegar uma das pedras existentes ao lado dos trilhos e colocar em cima do trilho. O bonde quando passava espatifava a pedra e soltava muita faísca. Diziam que era perigoso e que poderia até descarrilar o bonde. Espatifei muitas pedras, mas nunca consegui descarrilar nenhum bonde...
Uma brincadeira muito comum na Alameda Iraé era empinar papagaios. Eu fazia muito bem o “peixinho”, só duas varetinhas cruzadas e usava a linha 24 para empinar, cheguei a soltar um com seis carreteis inteiros, praticamente não dava para ver o papagaio, apenas sentia pela tração na linha. Outro papagaio muito comum na época era o “maranhão”, era feito com três varetas, mas esse eu não sabia fazer bem, mas tinha vontade de ter um.
Morava ao lado da linha do bonde entre as avenidas Chibarás e Açocê, um rapaz de chamado de “Carioca”. Uma vez juntei todo o meu dinheiro e comprei um Maranhão por cinquenta cruzeiros. E fui feliz soltar o papagaio. O Álvaro, filho da Dona do Bazar Ana Maria, fez uma proposta de brincadeira, de fazer um papagaio pegar o outro. Aceitei, mas um enroscou noutro e os dois caíram em algum lugar que eu nunca descobri. Perdi o tão sonhado papagaio no primeiro dia. Fiquei sem...
Outra coisa que começava a aparecer (pelo menos para mim), o cerol, era uma linha com cacos de vidro, finamente moídos. Dava trabalho fazer, colocavam-se cacos de vidro dentro de uma lata de óleo, e se martelava durante um bom tempo, até conseguir um pó de vidro suficientemente fino para colar na linha. Como a criatividade era grande, alguém descobriu que essa lata ao ser colocada sobre o trilho do bonde seria amassada por ele e...num instante, como um passe de mágica ... pozinho fininho de vidro ... Quantas latas aqueles bondes amassaram.


Ruy Ernesto N. Schwantes

4 comentários:

  1. Ruy... sempre nos presenteando!!!!

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  2. Tenho uma lembrança muito nítida acerca das viagens à Pça. João Mendes: durante o percurso no bonde, adormeci. Acordei sobressaltada ao perceber que estava com o rosto recostado no ombro de um senhor (desconhecido) muito bem vestido com um terno cinza claro. E nesse dia pude perceber o quanto babo ao dormir. Atualmente não nos ombros de pessoas desconhecidas, mas meus travesseiros são descartados frequentemente! Ah... minha mãe que estava sentada em frente e o homem riram muito quando acordei. Não sei se pelo meu espanto ou pela mancha da baba no terno cinza.

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  3. Andei muito nesse bonde ia para o trabalho todos os dias com êle, bons tempos
    Maria Julia

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  4. quantas hsitórias puder ver nas minhas idas e vindas no bonde, saudade boa

    Dionisio

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